Sorry, this entry is only available in Brazilian Portuguese. For the sake of viewer convenience, the content is shown below in the alternative language. You may click the link to switch the active language.

Mireille Fanon Mendes France – Há décadas, os ativistas, os povos, vítimas da ideologia da dominação, se questionam sobre a colonização, que deveria ser um assunto do passado; diante da impossibilidade de sair das estruturas coloniais, tentam identificar elementos que possam mudar o paradigma da dominação. Nesta perspectiva, se apropriaram de termos como colonialidade – construído a partir das palavras modernidade e colonização.

Ilustração do livro de Frantz Fanon - Os condenados da TerraEsta abordagem permite rastrear a lógica organizadora de um sistema que busca construir não somente um mundo onde tudo é objetivado e transformado em mercadoria, mas, mais radicalmente, um mundo onde o ser, o poder e o conhecimento funcionam e se interconectam de forma a perpetuar a ordem maniqueísta do mestre que ainda pensa possuir escravos.

Nesta ordem, os mestres não buscam apenas explorar escravos, mas, como observa Frantz Fanon, os mestres os consideram como “inessenciais” – a descolonização jamais passa despercebida porque atinge o ser, modifica fundamentalmente o ser, transforma espectadores sobrecarregados de inessencialidade em atores privilegiados [1] – e seu objetivo é eliminá-los, humiliá-los, e se não conseguirem, violentá-los.

 A indigeneidade e a cor escura da pele são elementos intrínsecos da colonialidade, embora existam outras formas de diferenciação humana que também desempenham um papel na sua formação, entre outros a sexualidade e o gênero. Anibal Quijano ressalta que a colonialidade é “uma construção ideológica nua, que literalmente não tem nada a ver com a estrutura biológica da raça humana e tudo a ver, no entanto, com a história das relações de poder no capitalismo mundial, colonial/moderno e eurocêntrico

O que o mundo branco europeu impôs como civilização nas Américas, tornou possível, sem qualquer justificação legal, a realização dos piores atos contra os povos não-cristãos vivendo fora dos reinos europeus. Além disso, esses modos de comportamento, usados em tempo de guerra, levaram à naturalização da guerra. Desde então, a violência extrema e a violência constante de baixo nível coexistem e são dirigidas contra as populações colonizadas e seus descendentes. (Maldonado-Torres 2008).

Se a descolonização se refere aos momentos históricos em que os assuntos coloniais se ergueram contra impérios antigos e reivindicaram sua independência, a descolonialidade se refere a uma luta contra a lógica da colonialidade e seus efeitos simbólicos, epistêmicos e materiais e que são visíveis nos níveis político, social, econômico e cultural, incluindo no da cidadania.

É este trabalho de identificação da colonialidade que devemos operar, durante o Fórum Social Mundial em Salvador de Bahia, de 13 a 17 de março de 2018.

Devemos fazer com que, nós, condenados, [2], possamos nos distanciar dos imperativos e das normas impostas, implementando processos para separar-se deles.

Entre condenados, o objetivo é do indivíduo “tocar o outro, sentir o outro, revelar-me no outro [3]».

Steve Biko tinha entendido o caráter fundamental desta atitude quando define a consciência negra como “uma atitude do espírito e um modo de vida, em poucas palavras, “o chamado mais positivo que emanou do mundo negro há muito tempo[4].

Envolver-se em uma atitude descolonial, consiste ao mesmo tempo em adotar uma atitude e inscrever-se em um projeto que prossegue, jamais enquadrado, e que busca “construir do mundo do vós” (Maldonado-Torres 2015). Essa luta é perseguida com amor, o condenado demonstrando uma atitude positive, sem deixar de lado a sua raiva, como forma de negação, inspirada e orientada pela atitude positiva do amor. Amor e raiva sendo a expressão do “Sim” e do “Não” que Fanon tinha identificado como primeira expressão da atitude descolonial.

É o que o lema do FSM de Salvador “Resistir é Criar, Resistir é Transformar” sustenta, mas que ocorrerá somente se for inscrito em uma atitude realmente descolonial.

A pergunta posta para este encontro é se haverá um verdadeiro lugar atribuído aos condenados que até então, após 16 anos de existência de fóruns, permaneceram invisíveis, de tal maneira que os participantes africanos acabaram desertando esses fóruns. O que dizer das pessoas de descendência africana ou de religião muçulmana? Invisíveis e assim infelizmente invisibilizados pelo processo que nunca permitiu que eles emergissem.

Vamos precisar, enquanto condenados, emergir, tornar-nos sujeito de questionamentos, de palavra, de escrita, de criação e de tranformação. Isto praticamente é impossível em um mundo moderno/colonial, então se o processo do FSM deve servir para alguma coisa, deve facilitar, estimular a abertura de saídas, derrubar muros e obrigar aqueles que inscrevem na construção de um outro mundo possível a levar em conta que o outro mundo a vir não poderá ser construído deixando os condenados a margem. Estes devem ser os iniciadores da abordagem descolonial.

Trata-se, para o processo do FSM de não continuar na espera de ser guarnecido pelos agentes da colonialidade. Todos os participantes devem estar atentos para não tornar-se, ocasionalmente ou não, agentes da colonialidade. Nesta perspectiva descolonial, o condenado não pode andar sozinho. A virada descolonial exige uma abordagem coletiva; até o presente momento, ignorada pelo processo do FSM.

Salvador, FSM 2018, deve ser o lugar de surgimento de um processo descolonial coletivo, em que todos juntos, buscaremos “construir o mundo do vós”, sem procurar reconhecimento nem reprodução do modelo dos mestres.

O desafio é grande, porque hoje, ainda mais do que antes, as elites e todos aqueles que continuam de identificar-se do lado da modernidade e do eurocentrismo, querem privar a humanidade da sua terra e da sua humanidade. As primeiras vítimas são os condenados e os invisíveis, então o desafio também está dentro do processo do fórum. Construir alternativas que partam dos condenados e dos invisíveis e construir com eles. Jamais para eles e muitos menos sem eles.

Mireille Fanon Mendes France

Fondation Frantz Fanon

Consultora em direito internacional

[1] Os condenados da Terra, Frantz Fanon (Les damnés de la Terre, Editions Maspero), 1961

[2] Condenados deve ser entendido no sentido de colonizado, excluído, estigmatizado qualquer que seja a razão.

[3] Pele Negra, Máscaras Brancas Frantz Fanon, (Peau noire, masques blancs, Editions Le Seuil), 1952

[4] A consciência negra,  Escritos da África do Sul, 1969-1977, Steve Biko

0 Comments

Leave a reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

*

Contato

Deixe uma mensagem e etornaremos o mais rápido possível. You can send us an email and we'll get back to you, asap./puede enviarnos un correo electrónico y nos comunicaremos con usted lo antes posible./vous pouvez nous envoyer un email et nous reviendrons vers vous, dès que possible.

Sending

Log in with your credentials

or    

Forgot your details?

Create Account